Vai fazer duas semanas que cheguei nos Estados Unidos e foi o suficiente pra eu sentir vontade de escrever, digo, essa vontade de narrar os fatos a todos e a ninguém. Como diria Drummond: "preciso de todos", ele que se expunha "cruamente nas livrarias". Escrevo de uma espécie de praça de alimentação na Michigan Union, um prédio do Campus Central da Universidade de Michigan em Ann Arbor, cidade vizinha a Detroit, que foi por onde eu entrei no país. Já na saída de Guarulhos, fiquei meio assustado com o hello, welcome; hello, welcome na entrada do avião, meu inglês definitivamente não é dos melhores. Perguntei em português ao passageiro do meu lado onde era o banheiro, ele disse I don't understand, então criei coragem e perguntei à aeromoça: excuse me, is there a restroom here?. É estranho falar inglês fora de uma aula de inglês. No desembarque em Detroit, depois de caminhar um bom pedaço por um corredor, pedi informação a um funcionário do aeroporto que me mostrou a fila dos visitantes e esclareceu: lugagge after inspection. Então foi só passar pela inspeção, pegar a bagagem e passar pela alfândega. Em seguida, após me informar numa casa de câmbio, sentei num banco à espera do ônibus que me traria a Ann Arbor. Alguém me perguntou algo sobre o jogo de futebol americano do dia anterior, ao que respondi com aquela frase que viria a repetir algumas vezes: I'm a stranger here, sorry, não sem gaguejar um pouco. Logo embarquei no ônibus da Michigan Flyer que me deixou no centro de Ann Arbor, onde desci empunhando duas folhas impressas do google maps. Com a ajuda do motorista, então, consegui localizar uma das principais ruas da cidade: a South State Street. Depois disso, tudo correu bem, me instalei, tomei um banho, e no dia seguinte pude conhecer melhor a cidade. O café aqui, em confirmação do que eu já havia lido num guia de viagem, é meio fraco, deve ser por isso que vem em copos bem grandes. Tanto melhor: assim tenho uma razão a mais pra me demorar nos cafés, que são lugares agradáveis e aquecidos, provavelmente bons refugios para quando a neve chegar, e/ou em eventuais sensaçoes de exílio. "Vivendo muito tempo num lugar estranho - diz Tim Maia, na canção 'Neves e Parques' - a gente tem medo de pensar / que nao volta pra casa nunca mais". E por falar em exílio, achei num sebo um livro cujo título estava curioso pra saber se aqui seria The foreign ou The stranger, agora eu sei que é The stranger e se encontra disponível em duas versões: uma britânica e outra americana, mais recente, que não hesitei em comprar. Como diz o tradutor, Matthew Ward, "Camus reconheceu empregar um 'método americano' ao escrever 'O estrangeiro', em especial na primeira parte do livro: as curtas, precisas sentenças..." (Camus acknowledged employing an 'American method' in writing 'The Stranger', in the first half of the book in particular: the short, precise sentences...). Só espero que depois não digam que eu voltei americanizado...
The uninhabitable earth
Há 6 horas