domingo, 31 de maio de 2009

A igreja dos ateus


para tullio stefano

Se Machado de Assis, há mais de um século, se permitiu criar a Igreja do Diabo, já era hora de criar uma igreja dos ateus, já que são tantos e, mais cedo ou mais tarde, vão acabar se organizando e dominando o mundo.
Bom, uma igreja não é uma igreja se não distinguir, desde já, o certo e o errado, o bem e o mal. Pois bem, o mal está no agnosticismo, que dissemina a falta de fé entre os ateus, levando-os a um quadro de niilismo profundo, chegando às vezes a evoluir para o suicídio. Assim, já que eu me auto-elegi para fundar esta igreja, tratei de escolher um representante do ateísmo no mundo animal: tenho aqui uma tartaruga, já bem velhinha, apontei pra ela e disse “tu és a pedra, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja e as portas do agnosticismo não prevalecerão contra ela”. Como ela não disse nem que sim nem que não, assim que ela morra, farei do seu casco, oco como a vida, a pedra angular de nossa igreja.
Outra lição que tiramos dos nossos colegas cristãos é a de dividir o trabalho em ministérios ou pastorais, para dar a impressão de engajamento e seriedade. Logo, em homenagem a ateus famosos, resolvi que os ministérios seriam, pra começar, três: o Ministério Dráuzio Varella, de cura e libertação; o Ministério Oscar Niemeyer, das causas sociais; e o Ministério Caetano Veloso, de louvor e adoração. Assim, com um representante de cada grande área, biológicas, exatas e humanas, demasiado humanas, será mais fácil dominar o mundo.
Os livros sagrados também podem começar com três: na base do velho testamento ficará “Assim falou Zaratustra” do profeta Friedrich Nietzsche; no novo testamento, Simone de Beauvoir emplacará com “Todos os homens são mortais”, onde explica que as mulheres, sim, é que são imortais; e o catecismo ficará por conta de Michel Onfray, com seu “Tratado de ateologia”. Nos próximos concílios, poderá ser negociada a entrada de Russel, com “No que acredito”, censurado como apócrifo devido à positividade subversiva do título. No índex entrará toda Patrística e Escolástica, além do Pe. Vieira.
Uma última coisa a ser considerada, última na ordem mas não na importância, é o dízimo que, já vou avisando, será chamado trízimo ou quadrízimo, já que a maioria dos ateus é oriunda de classes sociais mais altas (e, supostamente, mais esclarecidas). Enfim, como diria o profeta Karl Marx: ateus do mundo inteiro, uni-vos! E como diria Paulo de Toledo:

terça-feira, 19 de maio de 2009

tem piedade, satã, desta longa miséria!

O verso acima, de Charles Baudelaire, digno dos grafites nos muros e paredões de Curitiba, serve de epígrafe ao poema Balada da Cruz Machado, de Rodrigo Madeira, também publicado sob o pseudônimo Renata Amador, na edição 15 do Escritoras Suicidas. Adaptado para o audiovisual por Terence Keller, com direito a tomada da catedral deformada através do tubo do ligeirinho, o poema virou filme, como narra Rafael Urban em sua matéria para a Folha de Londrina de 26 de junho de 2008. Quase dois anos depois de idealizado e pouco mais de um ano após as filmagens, o curta estréia nesta sexta-feira, 22 de maio, às 20 horas, na Cinemateca, não muito longe, aliás, do próprio cenário, a rua Cruz Machado, aquela que termina, ao desenlace da esquina, nos pés de uma catedral.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

DIALÉTICA



É claro que a vida é boa
E a alegria, a única indizível emoção
É claro que te acho linda
Em ti bendigo o amor das coisas simples
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz

Mas acontece que eu sou triste...

Vinícius de Moraes

sábado, 2 de maio de 2009

Nazismo em Curitiba

Ao ler esta reportagem, não sem um certo susto e a boa e velha náusea, fui atrás dos referidos sites de orientação nazista, quer dizer, de "orgulho branco", que fazem apologia ao nazismo e coisas do tipo. Como, no caso, os assassinados eram nazistas, o comentário de um tal de Mr. Blonde em um destes sites diz: "Isto é um assassinio a um casal nacionalista, cujo o único 'crime' foi a sua ideologia politica...", e, não satisfeito em pôr crime entre aspas, conclui: "Que raiva...". Acontece que foi praticado, ao que tudo indica, em nome de outra ideologia política, na verdade outra corrente da mesma ideologia. As vítimas, apesar de serem nazistas, eram mais ou menos contra a violência (o que - parafraseando a reportagem - deporia contra o grupo e complicaria a aceitação do movimento pela sociedade), por isso foram exterminadas, provavelmente pelos próprios nazistas, que pra mim não passam de uma única grande corrente. Este fato parece também não ter sido observado por outro destes sites apologistas (atenção para a suástica), que se contenta em reputar o motivo como 'desconocido' e citar 'el delegado' (a notícia é brasileira, mas o blog é argentino): “Aún no sabemos si ellos fueron muertos por una persona que estaba dentro del coche con ellos o si fueron abordados en la carretera por el asesino”, além de aventar - faz tempo que estou querendo usar esta palavra - a hipótese de latrocínio. No terceiro dos 3 sites em questão, sob o lema "White Pride World Wide", não consegui achar sobre o assunto, mas como se trata de nazismo escarrado, pude achar coisas muito mais repugnantes, como esta ironia no título de um dos links: Mamãe, eu sou contra o Nazismo!!, e coisas pitorescas como a referência à afirmação de Lula de que 'brancos de olhos azuis' seriam responsáveis pela crise financeira ou algo assim: o tipo de afirmação sem pensar que joga água no moinho de oportunistas, e até uma espécie de fundamentação bíblica para a anti-miscigenação, o que não espanta nem um pouco, já que a Bíblia é cheia destes disparates e os nazistas são plenamente capazes de religiosidade, como se vê pela sua tendência ao culto de Odin, "o deus dos nórdicos", e por sua crença na vida após a morte em Valhalla, "aonde vivem os fortes". Mas isto não vem ao caso, o fanatismo político destes seres humanos (putz!) já vai muito mais longe do que este seu inocente devaneio religioso, já estou fugindo do tema, como diria o Mr. Blonde: Que raiva... Expressão que, aliás, vinda de entusiastas do crime de ódio (e sem aspas, por favor!), não poderia ser mais cínica.