Paulo Cesar de Araújo, março de 2004
Entre as músicas do repertório:
Tortura de amor - Waldik Soriano (1974): "...Naquele ano a prática da tortura ainda era utilizada no combate a brasileiros suspeitos de atitudes subversivas ou terroristas. (...) Por certo a música de Waldik tocava numa ferida que o regime militar não queria ver exposta pela lente ampliadora da canção popular. Afinal, como anunciava uma reportagem de capa da revista Veja no início do governo Médici: 'O presidente não admite torturas'. E, pelo visto, nem de amor."
A galeria do amor - Agnaldo Timóteo (1975): "Ousada e polêmica, esta composição faz referência à Galeria Alaska, tradicional ponto de encontro de homossexuais no Rio de Janeiro. Formando uma travessia de cerca de 100 metros entre as avenidas Atlântica e Nossa Senhora de Copacabana, no Posto 6, Zona Sul carioca, a Galeria Alaska tornou-se famosa a partir dos anos 60, quando chegou a ser classificada como o maior reduto de gays do país. (...) E, segundo Timóteo, a inspiração para compor o tema surgiu de uma experiência vivida por ele na própria galeria. O sucesso da música foi imenso e abriu o caminho para o artista sair da sombra e revelar o seu avesso: o do homem frágil, dividido, fustigado pela prática do 'amor que não ousa dizer o nome', na expressão de Oscar Wilde."
Vou tirar você desse lugar - Odair José, com Caetano Veloso (1973): "Documento de uma época, esta faixa registra o encontro histórico de Caetano Veloso e Odair José cantando juntos o hit inspirado nas prostitutas da Praça Mauá. (...) Espécie de patinho feio incluído em uma festa que reunia a nata da MPB, Odair José não poderia deixar de causar reação em um público preso a preconceitos estéticos de sua formação de classe média. E, assim que subiu ao palco - atrapalhando o público que estava ali para ouvir Caetano Veloso -, o autor de Vou tirar você desse lugar se deparou com ruidosa vaia no Palácio das Convenções do Anhembi. Reagindo à intolerância da plateia, em um tom ao mesmo tempo irônico e irritado, Caetano desferiu uma das suas frases que se tornaria famosa: 'Não existe nada mais Z do que um público classe A'."
Adaptado de: Paulo Cesar de Araújo, responsável pela seleção de repertório do CD e autor do livro Eu não sou cachorro não - música popular cafona e ditadura militar (Ed. Record, 2002), no qual as informações do encarte se encontram aprofundadas e detalhadas.
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