Normalmente falo de religião de maneira efusiva, mas agora vou adotar como critério só o que ela contém de tema, quer dizer, meu tema será simplesmente um meta-tema, deixando pra trás meu ateísmo militante em favor de um ateísmo metodológico, portanto serei o mais imparcial possível, se é que isso é possível...
A religião hoje, mais do que outros temas, parece tomar as proporções de um tabu. Tome-se por exemplo o sexo, admito que é um tema bem mais excitante do que religião, mas, como no passado dividia com ela a mesma tensão, acredito que a comparação seja boa.
Apesar de discutido à exaustão, o sexo continua sendo algo proibido para certos horários, idades e ocasiões. Porém, fora destes horários, idades e ocasiões, ele pode VOLTAR a ser tratado com toda a naturalidade. Trata-se, pois, de um resquício de proibição, mas uma proibição puramente EXTERNA.
Quanto à religião, não é difícil perceber que a situação se inverte. Um fantasma ronda o tema, e isto devido, entre outras coisas, ao pluralismo e onipresença da religião, reforçados pela lei da liberdade de crença que, ao invés de diminuir os preconceitos, nos lança em constante estado de guerra fria. Sua proibição não se expressa em classificações, estilo "programa inadequado para evangélicos", nem em rótulos, tipo "produto destinado a esotéricos". De onde vem a proibição? Ela é puramente INTERNA.
Se, por um lado, a sociedade conseguiu se tornar laica, por outro transformou o sagrado em aberração. A religião hoje está no mesmo plano de uma contracultura, assim como os punks, emos etc. Creio que a razão disso é o fato de a secularização ter atingido apenas o âmbito coletivo, social, cobrindo com uma nuvem de poeira o âmbito individual, onde reside a fagulha da religião. Pois, embora se tenha buscado explicações sociológicas para temas como religião e suicídio, suas razões são de viés estritamente filosófico, no máximo psicológico. E ainda que não fossem, é preciso admitir que, de qualquer forma, embora sejam fenômenos TAMBÉM coletivos, são ANTES individuais.
Acredito que isso explique a popularização do sexo em detrimento da religião. Pois, enquanto a religião (ou a falta dela) é, antes de tudo, uma experiência solitária, o sexo é uma experiência coletiva, não estou falando de sexo grupal, ele é uma EXPERIÊNCIA coletiva e não um ATO, e coletiva na medida em que é movido em quase todos pelas mesmas razões e, com raras exceções de orgasmo múltiplo, tem o mesmo efeito para todos, ao contrário da religião. Esta, sendo essencialmente subjetiva, acaba se integrando à nossa personalidade (dizem que a formamos aos vinte, e aos quarenta não a mudamos mais), razão pela qual, por diplomacia, procura-se evitar o tema da religião que, em última instância, soaria como um insulto à própria PESSOA e não à INSTITUIÇÃO.
Mas, se o fato de a religião integrar-se tão estreitamente à pessoa torna o tema, por um lado, proibido, por outro, torna-o de suma importância. Assim o sexo, por sua vez, tendo sido absorvido pelo caráter objetivista da sociedade, sofre o processo inverso da religião, pois, embora seja também de suma importância, acaba sendo banalizado pela repetição dos discursos.
Ora, se é mesmo verdade que a religião está tão presente quanto o sexo, ou até mais, ao ponto de não ser possível permanecer neutro diante dela sem ser chamado de agnóstico, se é assim, então talvez toda discussão sobre religião acabe caindo numa espécie de pornografia da alma, em que se tenta pôr a nu as mais diversas crises existenciais, vividas nas situações mais solitárias, mais ou menos como um adolescente que se masturba no banheiro, às escondidas. E isso tudo acaba sofrendo a censura do objetivismo social. Eis porque, para além da política e do futebol, acho que a religião é tabu.
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Há 11 horas