Quem escreve este artigo é alguém que é professor universitário há
quase 20 anos e que gostaria de estar neste momento escrevendo o
contrário do que se vê obrigado agora a dizer. Pois, diante das
circunstâncias, gostaria de aproveitar o espaço para escrever
diretamente a meus alunos e pedir a eles que não sejam professores, não
cometam esse equívoco. Esta "pátria educadora" não merece ter
professores.
Um professor, principalmente aquele que se dedicou ao ensino
fundamental e médio, será cotidianamente desprezado. Seu salário será,
em média, 51% do salário médio daqueles que terão a mesma formação. Em
um estudo publicado há meses pela OCDE, o salário do professor brasileiro aparece em penúltimo lugar em uma lista de 35 países, atrás da Turquia, do Chile e do México, entre tantos outros.
Mesmo assim, você ouvirá que ser professor é uma vocação, que seu
salário não é assim tão ruim e outras amenidades do gênero. Suas salas
de aula terão, em média, 32 alunos, enquanto no Chile são 27 e Portugal,
8. Sua escola provavelmente não terá biblioteca, como é o caso de 72%
das escolas públicas brasileiras.
Se você tiver a péssima ideia de se manifestar contra o descalabro e a
precarização, caso você more no Paraná, o governo o tratará à base de
bomba de gás lacrimogêneo, cachorro e bala de borracha. Em outros
Estados, a pura e simples indiferença. Imagens correrão o mundo, a Anistia Internacional
irá emitir notas condenando, mas as principais revistas semanárias do
país não darão nada a respeito nem do fato nem de sua situação. Para
elas e para a "opinião pública" que elas parecem representar, você não
existe.
Mais importante para elas não é sua situação, base para os resultados
medíocres da educação nacional, mas alguma diatribe canina contra o
governo ou os emocionantes embates entre os presidentes da Câmara e do
Senado a fim de saber quem espolia mais um Executivo nas cordas.
No entanto, depois de voltar para casa sangrando por ter levado uma
bala de borracha da nossa simpática PM, você poderá ter o prazer de
ligar a televisão e ouvir alguma celebridade deplorando o fato de o país
"ter pouca educação" ou algum candidato a governador dizer que educação
será sempre a prioridade das prioridades.
Diante de tamanho cinismo, você não terá nada a fazer a não ser
alimentar uma incompreensão profunda por ter sido professor, em vez de
ter aberto um restaurante. Por isso o melhor a fazer é recusar-se a ser
professor de ensino médio e fundamental. Assim, acordaremos um dia em um
país que não poderá mais mentir para si mesmo, pois as escolas estarão
fechadas pela recusa de nossos jovens a serem humilhados como
professores e a perpetuarem a farsa. (Folha de S. Paulo, 05-05-2015, disponível aqui).
Mini galeria de perguntas meramente retóricas
Há 13 horas
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