quarta-feira, 10 de abril de 2013

Citação

I was... uh... I was having a drink with my old teacher, he is a hundred and two now, and... this was... he was just about ninety seven at the time, and... I pored my drink and... he clicked my glass and he said: "excuse me for not dying"... (risos) I kind of feel the same way... (risos). I want to thank you, not just for this evening, but for the many years that you've kept my songs alive. (Leonard Cohen, Live in London)

sábado, 6 de abril de 2013

Adeus a tudo aquilo*

Ao longo dos últimos dez anos publiquei, neste ou naquele veículo, cerca de vinte trabalhos sobre a filosofia da religião. Tenho um livro sobre o assunto, Deus e o ônus da prova, e outro que critica a apologética cristã, Por que não sou um cristão. Durante minha carreira acadêmica debati com William Lane Craig duas vezes e duas vezes com criacionistas. Escrevi uma tese de mestrado e uma de doutorado sobre a filosofia da religião, e ministrei cursos sobre o assunto inúmeras vezes. Mas não mais. Basta. Estou de volta ao meu interesse real, que se situa na história e filosofia da ciência e, após terminar alguns compromissos em andamento, não escreverei mais nada sobre a filosofia da religião. Eu poderia dar muitos motivos. Por um lado, acho que um grande número de filósofos representaram os argumentos a favor do ateísmo e do naturalismo tão bem quanto possível. Graham Oppy, Jordan Howard Sobel, Nicholas Everitt, Michael Martin, Robin Le Poidevin e Richard Gale têm produzido obras de grande sofisticação que destroem os argumentos teístas tanto em suas formulações clássicas quanto nas mais recentes. Ted Drange, JL Schellenberg, Andrea Weisberger, e Nicholas Trakakis apresentaram poderosos, e, a meu ver, irrespondíveis argumentos ateológicos. Gregory Dawes tem um livro extraordinário mostrando exatamente o que há de errado com "explicações" teístas. Erik Wielenberg mostra muito claramente que a ética não precisa de Deus. Com humildade honesta, realmente não creio que tenha muito a acrescentar a estas obras excelentes.

Em primeiro lugar, porém, o que me motiva é um sentimento de tédio, por um lado, e de urgência, por outro. Dois anos atrás, ministrei um curso de filosofia da religião. Estávamos usando, entre outras obras, Cartas para um Thomas em dúvida: argumentos a favor da existência de Deus, de Stephen C. Layman. Nas aulas tento apresentar material que considero antitético ao meu próprio ponto de vista da forma mais justa imparcial possível. Com o livro de Layman, fiz um esforço enorme para consegui-lo. Achei-me, literalmente, temendo ter de passar por essa obra em sala de aula: não, deixe-me salientar, porque estivesse intimidado pela força dos argumentos. Ao contrário, achei os argumentos tão execráveis e sem sentido que me aborreciam e enojavam. Ora, Layman não é um maluco ou um ignorante, ele é o autor de um livro de lógica muito útil. Tenho que confessar que hoje considero "os argumentos a favor do teísmo" como fraudes e já não consigo apresentá-los aos alunos como se represetassem uma posição filosófica respeitável, assim como não conseguiria apresentar o desígnio inteligente como uma teoria biológica legítima. Aliás, ao dizer que considero os argumentos para o teísmo como fraudes, não pretendo acusar as pessoas que os usam de vigaristas, que visam enganar-nos com afirmações que sabem serem falsas. Não: os filósofos teístas e apologistas são quase dolorosamente sinceros e honestos; não penso que haja um Bernie Madoff no grupo. Simplesmente não consigo mais levar a sério seus argumentos e, quando não conseguimos levar uma coisa a sério, não devemos lhes dispensar uma atenção acadêmica séria. Passei para um colega os cursos de filosofia da religião.

Como disse, há também um sentido de urgência. Acabo de completar 58 anos e quero dedicar os relativamente poucos anos restantes de minha vida acadêmica àquilo que não apenas respeito, mas amo. Adoro a astronomia; adoro a geologia; adoro a paleontologia, e acho a história desses campos fascinante. Também estou muito interessado nos problemas filosóficos associados com as ciências históricas. Como compreender e reconstituir acontecimentos que tiveram lugar no fundo do tempo é um interesse profundo e permanente para mim. Publiquei dois livros sobre a história da paleontologia de dinossauros, e voltarei a esse tipo de coisa.

Assim, com exceção dos compromissos que estou terminando agora, abandono a filosofia da religião. Talvez ainda responda a algumas críticas aos meus trabalhos publicados. Por exemplo, o Secular Web tem uma crítica longa do meu ensaio "Não se necessida de criador”, e eu poderia responder a ela. Continuarei de vez em quando a postar coisas no Secular Outpost. Quanto ao resto de vocês, que estão combatendo o bom combate contra o sobrenaturalismo, por favor continuem. Alguém precisa se opor a esse tipo de coisa. Apenas, não serei eu.

Keith Parsons

*texto encontrado no blog Acontecimentos, de Antonio Cicero.

Desencontro

Daniela esteve aqui hoje, procurando por mim. A dona da casa lhe disse que eu não estava, mas que ela podia esperar no meu quarto, se quisesse. Ela esperou por quinze minutos. Tentei ligar, mas o número não existia. Sentei na cama, pensei: ela deve ter sentado aqui. Imaginei seu campo de visão. As mãos metidas entre as coxas. Ao lado da cama, um livro vagabundo, um best-seller. Meu mau gosto, pensei, meu mau gosto terá sido um sinal de que me resta algo de humano. Sobre a cômoda, a nota fiscal do restaurante que frequento. Bem se vê que não sou pessoa de luxo. Nenhuma revista pornográfica nas prateleiras. Melhor assim: a imagem de um homem se masturbando, segurando a folha que o vento ameaça virar, não é das melhores. As roupas jogadas no chão terão sido um sinal de um certo desleixo, de um homem que tem coisas mais importantes pra pensar. Os analgésicos, os calmantes, os anti-histamínicos. Gostaria de ter explicado que os anti-depressivos são temporários. Daniela deve ter achado que minha vida é difícil. Não deixa de ser. Olho no relógio, passou-se quase uma hora. Uma hora é bem mais que quinze minutos. Daniela não quis deixar recado. Mas percebo que ela entreabriu a janela. Deve ter sido isso. Percebeu que o mundo lá fora é muito maior.

(28/03/2013)