segunda-feira, 9 de março de 2009

Camus (3)


"Noite de insônia. O dia todo, passeio uma cabeça oca e um coração vazio. O mar está mau. O céu fechado. O convés deserto. Além disso, desde Dacar não somos mais do que uns vinte passageiros. Cansado demais para descrever o mar hoje". (Albert Camus, Diário de Viagem. América do Sul, 8 de julho de 1949)

terça-feira, 3 de março de 2009

Mais uma de ônibus


O ligeirinho pára no tubo, entro pela porta da frente. Passo o olho pelo interior do ônibus. Um gordo em pé, mal acomodado na parte reservada a cadeiras de roda, olha para trás, como se procurasse alguém. Seu pescoço, todo torcido, não me deixa ver seu rosto, de modo que vejo apenas sua mandíbula ruminando um chiclete.
Procuro olhar a rua, molhada da chuva. À minha frente um banco vazio, nele uma pequena poça de água dança de um lado a outro, embalada pelo andar do veículo. Sem querer, minha vista encontra o gordo de novo, olhando para trás outra vez.
De repente o motorista freia, ou bate, meus pés pulam do piso. Todos gritam, fazem exclamações, uns riem. Nesta fração de segundo, olho o lugar das cadeiras de roda, desta vez o gordo não olha para trás. Do ferro em que está sentado, é lançado num salto para frente, batendo com o rosto contra o ferro de segurar-se. Após o choque, afinal consigo ver seu rosto, o olhar com alto grau de estrabismo, o que lhe dá um ar de perdido. “Então ele era vesgo”, pensei, “ou ficou agora”?