O problema hoje não é o jovem que crê nem o que não crê em Deus, estes passam bem; em outras palavras, o problema não é SE o jovem crê em Deus ou não, mas a abordagem que ele faz do sobrenatural. Entenda-se como sobrenatural o simples surgimento da matéria e da energia (base da ciência), ou o sentido que se dá para cada ato corriqueiro da vida (base da religião).
Apesar de difundido, o tema - o famoso "sentido da vida" - sempre toma, entre o misticismo e a teoria do acaso, ora um ora outro rumo, ao invés de encerrar em si a discussão, ou seja, questionar o sentido da vida de fato, sem remetê-lo à arte, à religião ou à ciência. Com efeito, não se procura saber a anatomia do camelo estudando o cachorro; assim também à questão existencial não se pode simplesmente anexar a questão teológica ou estética. O exemplo de um artista qualquer ou de um rockeiro, que diante da pergunta sobre religião dá como resposta um muxoxo de desdém, desvenda o caráter compensador da arte, posta em lugar da religião; o mesmo vale para um padre sem gosto musical.
Porém a arte e a religião são apenas exemplos que preenchem o papel de ópio. Alguma coisa é o ópio do povo: a religião já perdeu muito de tal papel, cedendo à DIversão (às raves e baladas), à diluição da individualidade. Dioniso (deus do vinho) toma o trono ao Deus eclesiástico, conquanto este também dilua a individualidade, mas de maneira mais antiquada que aquele. O problema, que aqui estendo aos jovens que não são mas se dizem religiosos, é o valor que dão para a palavra "Deus" - fazendo coro com os 99% de não-ateus do mundo.
Tal jovem goza do privilégio de dançar, usar drogas e fazer sexo (algo perto do hedonismo) e ao mesmo tempo pousar de bom moço diante de puritanas senhoras, lançando mão da palavra "Deus", Tais senhoras crêem em Deus enquanto algo mais que palavra, por isso se asseguram do sentido de suas vidas o suficiente para esnobar os prazeres do corpo.
É evidente que Deus não se opõe a tais prazeres, a única oposição aqui é entre Deus-guia-da-vida e o Deus emblemático e auto-afirmativo da juventude, porquanto PALAVRA. O Deus das senhoras é também palavra, bem como os tratados teológicos, porém palavra comprometida com um conceito (vazio ou não) de Deus. Os jovens não têm conceito de Deus, até porque não são dados a estudos bíblicos ou doutrinários ( como a catequese). Uma coisa é dar à cadeira o nome de cadeira, outra é batizar uma banda de cadeira ou de "Os cadeiras"; o primeiro caso é ciência, tal como a teologia, o segundo é marketing.
Deus é, pois, publicidade pessoal. E isto é devido ao inconsciente coletivo que associa à idéia de Deus à idéia de bem; mais de uma vez se pode deparar um ateu com a ressalva de que, APESAR de ateu, é bom. É estranho que um pastor não precise se justificar que, APESAR de pastor, é bom. Entretanto, à revelia do discurso de Glauco, descrito por Platão na "República", pode-se atinar que é mais fácil uma pessoa "má" se esconder atrás do pretexto religioso que uma pessoa boa, sem tais pretextos, provar que é boa.
A diversão, por sua vez, está associada à idéia de popularidade, isto é, de legitimidade perante os amigos, a qual tem muito mais força que a idéia de bem, de bondade. É melhor ser popular que ser bom, portanto a diversão suplanta Deus, aquele das senhoras.
Assim fica explanado o vazio da religião jovem, que acaba por se desvelar em ateísmo floreado, mera paródia do ateísmo esclarecido, e que tem como alternativa o satanismo emblematizado pelo Diabo-palavra, do movimento anticristo.
(Otávio)
Mini galeria de perguntas meramente retóricas
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